O mês de março de 2025 trouxe um cenário preocupante para a indústria automotiva brasileira, marcando um recuo significativo na produção de automóveis. Com uma produção de 190 mil unidades, o setor experimentou uma queda de 12,6% em relação a fevereiro, refletindo uma desaceleração que preocupa os fabricantes. Esse foi o pior março desde 2022, uma marca que demonstra como o mercado pode ser volátil e suscetível a flutuações sazonais e estruturais. Embora o primeiro trimestre tenha mostrado uma recuperação considerável comparado aos primeiros meses de 2024, março trouxe um alarme sobre a sustentabilidade desse crescimento.
Apesar da desaceleração observada em março, os números do primeiro trimestre de 2025 indicam que, no acumulado, o setor automotivo brasileiro tem se mostrado resiliente. Com 583 mil unidades produzidas no primeiro trimestre, houve um aumento de 8,3% em relação ao mesmo período do ano passado, o que marca o melhor desempenho desde 2021. Essa recuperação parcial é, no entanto, ameaçada por fatores que indicam que a indústria ainda enfrenta desafios significativos. A redução nas exportações e a queda na produção de veículos indicam que o setor automotivo precisa de mais estímulos para manter a trajetória positiva.
Entre os fatores que mais impactaram a produção de automóveis, destaca-se a redução do ritmo nas fábricas de automóveis e comerciais leves, com um ajuste no estoque de cerca de 8 mil veículos. Isso reflete uma estratégia das montadoras de reduzir a produção para alinhar a oferta à demanda do mercado interno e, ao mesmo tempo, lidar com uma excessiva dependência de modelos importados. A desaceleração nas exportações, que teve uma queda de 19% em março, também levanta questões sobre a competitividade do mercado automotivo brasileiro em um cenário global cada vez mais competitivo.
O impacto nas vendas de veículos foi, de certa forma, amortecido pela crescente participação de modelos importados. Em março, essas unidades representaram 61% do aumento nas vendas, destacando a forte presença de veículos vindos da Argentina e da China. Essa dependência de modelos importados pode ser uma faca de dois gumes para o setor automotivo, pois, por um lado, garante o crescimento das vendas, mas, por outro, coloca o mercado interno em uma posição vulnerável diante de possíveis mudanças nos acordos comerciais e nas políticas de importação.
Em termos de emplacamentos, março registrou 195,5 mil unidades vendidas, um aumento de 5,7% sobre fevereiro. No entanto, uma parte significativa dessa alta foi impulsionada por vendas diretas, especialmente para locadoras, que tiveram um aumento de 14 pontos percentuais em relação ao varejo. Esse fenômeno revela uma mudança nas preferências de consumo, com uma maior adesão às vendas por canais não convencionais, como locadoras de veículos, ao invés do tradicional modelo de varejo.
As exportações também seguiram um caminho ambíguo em março. Embora o total acumulado no trimestre tenha apresentado um crescimento de 40,6%, com destaque para o aumento de 120% nos embarques para a Argentina, as exportações sofreram uma queda expressiva em março. Isso gera incertezas quanto à sustentabilidade desse crescimento nas exportações no curto prazo. Essa desaceleração nas exportações de veículos pode ser indicativa de que o setor automotivo precisa de novas estratégias para garantir sua competitividade internacional.
Outro ponto crítico que pode afetar negativamente o desempenho da indústria automotiva brasileira é o atraso na regulamentação do Programa Mover e a falta de recursos para Pesquisa & Desenvolvimento (P&D). O presidente da Anfavea, Márcio de Lima Leite, expressou preocupações sobre o impacto desses fatores, além da questão da não recomposição do Imposto de Importação para veículos eletrificados, o que pode prejudicar os investimentos necessários para a inovação no setor. Esses desafios são especialmente relevantes em um momento de crescente tensão geopolítica, que afeta diretamente a economia global e, consequentemente, o setor automotivo.
O cenário atual também é marcado por uma ameaça significativa à indústria nacional: o pedido de empresas chinesas para a redução de impostos sobre a produção de veículos no Brasil. Se atendido, esse pedido pode resultar em uma concorrência desleal para os fabricantes brasileiros e prejudicar os empregos gerados pela indústria automotiva no país. Esse risco é amplificado pela pressão externa causada por tarifas impostas por países como os Estados Unidos, que afetam a cadeia de suprimentos global e impactam diretamente os custos de produção de automóveis no Brasil.
Em um cenário de desafios econômicos e comerciais, a recuperação da produção de automóveis no Brasil depende de uma combinação de fatores internos e externos. A desaceleração observada em março não pode ser ignorada, mas também não deve ser vista como um sinal de crise iminente. O setor automotivo brasileiro tem se mostrado resiliente, e com a implementação de políticas públicas eficazes e estratégias de inovação, é possível que o setor recupere seu crescimento nos próximos meses. O foco agora deve ser em mitigar os riscos e criar um ambiente favorável para investimentos sustentáveis e de longo prazo, garantindo a competitividade do Brasil no mercado global de automóveis.
Autor: Adam Scott